miércoles, 9 de septiembre de 2015

MARGARIDA FERRA [17.019] Poeta de Portugal


MARGARIDA FERRA 

(Lisboa, Portugal 1977)
Tiene 38 años y dos hijos. Licenciada en Ciencias de la Comunicación de la Facultad de Ciencias Sociales y Humanas, Universidad Nueva de Lisboa. Trabajó en una pizzería, un periódico, una galería de arte contemporáneo en dos librerías y Ayuda Palace. Ahora trabaja en un grupo editorial, que no es el mismo en el que publicó en 2010 un libro con 32 poemas - tantos como los años tenían en ese momento. 

Debutó en la poesía con el libro Curso Intensivo de Jardinagem, en 2010. En 2013 publicó Sorte de Principiante, su segundo libro.



POEMAS DEL INICIO

(del libro Sorte de principante)

1.

En las noches de mayo, si corre
brisa, una chaqueta de punto. Caminaré, como si supiera
el destino de todas las cartas enviadas
por correo postal. Sé escoger el mejor
umbral para apoyar un pie u hombro.
Haré la mejor elección, basada
nada más que en los criterios rigurosos de mi intuición.
Comprobaré regularmente si he recibido
mensajes cortos o telepáticos.

Es probable que entre en una iglesia y busque
mi recibo, pensando que estoy
en la delegación de hacienda.
«Elecciones seguras, con la edad que tiene»,
Me dice el médico.

Usaba sobre todo
frases sin predicados
y me recetó el mismo tratamiento,
preventivo,
siguiendo la teoría más divulgada de Marshall MacLuhan.


2.

No vengas, todavía, a esta estación:
te mando postales todos los días,
lo prometo,
te envío cajas de fruta de distintas temporadas,
aun cuando no haya frutales
en los barrios o
en agosto. 

No vengas por tierra
y nunca por debajo de ella.
La luz es también en verano lo que nos redime
y el cielo siempre el mejor camino.
Todas las direcciones están claras
si no tuviéramos los pies en el suelo
(diez centímetros, lo que necesitamos)
y trajéramos en brazos a los perros que recogemos
en las calles de otras ciudades: mendigan
con nosotros, se ofrecen vistas amplias,
ojos más que amables,
instrucciones para ayudar con precisión.

No traigas máquina fotográfica,
escribe en un cartón viejo y
usa las cajas altas, indicadores
de necesidades e ironías.
Un marcador negro es suficiente
para todo lo que es urgente
en los días largos.

No vuelvas antes del equinoccio, amanece
temprano y cuelga el corazón.
En alto somos más, inmensos,
sumergidos entre los visitantes,
nadie es de aquí hace más de siete décadas.
Usa el río para tus necesidades poéticas,
usa alas de madera si necesitas venir antes.
Un banco de piedra: todo lo que tengo
para acogerte, si aún soportas esta luz
y el sol demasiado evidente.

Si entre tanto ya hubieras llegado,
no te vayas.
Somos prisioneros
de las piedras de la calzada siempre que pisamos
el basalto. La ciudad nos ata los pies
uno a otro,
nuestros dedos van a tocarse
de día, dudas pueden llevarnos a los dedos de otros
y no vamos a evitarlos porque Lisboa
va otra vez a atraparnos con paredes de aire
forradas de azulejo barato o antiguo.
Entre julio y setiembre
No hay reglas
que ayuden a levitar o nos lo impidan.

*Traducción de Mario Grande.





POEMAS DO INÍCIO

(del libro Sorte de Principiante, 
& etc. , Lisboa, 2013)

1.

Nas noites de Maio, se correr
uma aragem, um casaco
de malha. Caminharei, como se soubesse
o destino de todas as cartas enviadas
por correio postal. Sei escolher a melhor
soleira de porta par apoiar um pé ou ombro.
Farei a melho escolha, baseada
ápenas nos critérios rigorosos da minha intuição.
Verificarei regularmente se recebi
mensagens curtas ou telepáticas.

É provavel que entre numa igreja e procure
a minha senha, pensando que estou
na repartição de finanças.
«Escolhas seguras, com a idade que tem»,
disse-me o médico.

Usava sobretudo frases
sem predicados
e prescreveu-me o mesmo tratamento,
preventivo,
seguindo a teoria mais divulgada de Maeshall MacLuhan.



2.

Não venhas, ainda, esta estação:
mando-te postais todos os dias,
prometo,
envio-te caixas de fruta de várias épocas,
mesmo se não há pomares
nos bairros o
em agosto.

Não venhas por terra
e nunca debaixo dela.
A luz é também no verão o que nos redime,
e o céu sempre o melhor caminho.
Todas as vias estão certas
se não tivermos os pés no chão
(dez centímetros, o que precisamos)
e trouxermos ao colo os cães que recolhermos
nas ruas de outras cidades: mendigam
connosco, oferecem-se vistas largas,
olhos mais do que amáveis,
instruções para ajudar com precisão.

Não tragas máquina fotográfica,
escreve num cartão velho e
usa as caixas altas, indicadores
de necesidades e ironias.
Um marcador preto é suficiente
para tudo o que é urgente
nos dias longos.

Não voltes antes do equinóccio, amanhece
cedo e pendura o coração.
Ao alto somos mais, imensos,
submersos entre os visitantes,
ninguém é daqui há mais de sete décadas.
Usa o rio para as tuas necesidades poéticas,
usa asas de madeira se precisares de vir antes.
Um banco de pedra: tudo o que tenho
para te acolher, se suportares ainda esta luz
e o sol demasiado evidente.

Se entretanto já tiveres chegado,
Não vás.
Somos prisioneiros
das pedras da calçada sempre que pisamos
o basalto. A cidade ata-nos os pés
um ao outro,
os nossos dedos vão tocar-se
de dia, dúvidas podem levar-nos aos dedos de outros,
e não vamos evitá-lo porque Lisboa
vai outra vez prender-nos com paredes de ar
forradas a azulejo barato ou antigo.
Entre julio e setembro
não há regras
que nos ajudem ou impeçam de levitar.  








Nombre común: Jazmín - de – los – Poetas

Al anochecer, recorría los jardines
de la ciudad buscando las flores
 oficiales – suben amparadas
y perfuman con la memoria
del té las calles irregulares.
Llevaba un cortaúñas,
insuficiente e innecesario porque
no cortaba nada que estuviese vivo.  
Me quedaban frases sueltas,
páginas dobladas, sillas desiguales
y los platos vacíos
dejados a los gatos.
Encontré el primer poema
en una de esas búsquedas,
debajo del árbol más grande,
colgado de la copa,
con una pinza de tender.



Nome comum: Jasmim-dos-Poetas

Percorria ao anoitecer os jardins 
da cidade à procura das flores
oficiais – sobem amparadas 
e perfumam com a memória 
do chá as ruas irregulares. 
Levava uma tesoura de unhas,
insuficiente e desnecessária porque
não colhia nada que fosse vivo.
Restavam-me frases livres,
páginas dobradas, cadeiras desiguais
e os pratos vazios deixados
aos gatos. 
O primeiro poema encontrei-o 
numa dessas buscas
debaixo da árvore maior,
no ferro que sustenta a copa,


preso com uma mola da roupa.



Morada

Habitamos
una casa cuando
queda la sombra de nuestros gestos
incluso después
de cerrar la puerta.

            
        
Morada

Habitamos
uma casa quando
a sombra dos nossos gestos
fica mesmo depois
de fecharmos a porta.                                                                       
     
De Curso intensivo de jardinagem, 2010
Traducción: Verónica Aranda



Escreve sempre que precisares

Escreve sempre que precisares de me dizer 
que há gelo nas tuas mãos e nas paredes do frigorífico. 
Os legumes que trouxe ontem 
não sobrevivem a mais do que uma geada, 
muito menos nós.

Escreve sempre que precisares, podes 
dizer-me outra vez que nunca houve inverno,
que este ano não há verão,
que estamos aqui e não estamos porque não sabemos 
se somos nós ou se somos aquelas 
quatro pessoas que vão à rua agora, 
encontraram a porta certa.

Escreve sempre que precisares, faz 
uma lista de compras, uma lista de desejos,
anota todos os pedidos que deixaste 
em poemas atrasados.
Escreve sempre que precisares 
de mais um postal com selo e carimbo. 
Escreve sempre que riscares 
na tua agenda mais uma morada.

Sempre que eu precisar vais devolver-me
uma caligrafia rebuscada que não é a tua, 
curvas a mais que não fazias na letra d.
Já não há desses manuscritos, 
só eu e os carteiros aprendemos a decifrá-los
(e toda a gente sabe que nem isso é verdade).
Vai escrevendo. Sempre que eu precisar, 
as frases podem desviar deixas decoradas, 
repetidas como as mentiras,
demasiado gastas para serem inócuas.

Escreve em vez de costurares. 
Mesmo que soubesses, não há remendos suficientes,
arranhaste sem possibilidade de cura os joelhos, 
os cotovelos e as canelas 
(dançar sempre foi um antídoto fora do teu alcance).
Escreve que eu vejo nas tuas as minhas quedas,
os meus soluços nessas curvas 
a mais que não fazes na letra d:
as tuas linhas são rectas, verticais e justas,
as minhas letras são apenas caracteres.

Escreve sempre que puderes
só em vez de apenas,
recursos humanos em vez de 
resíduos urbanos. Talvez sejamos mais 
do que pessoas, temos tamanhos diferentes
e não servimos nos lugares que nos foram destinados.

Escreve sempre que precisares de uma porta
onde caibas, 
nunca trago chaves comigo.

in Curso Intensivo de Jardinagem (2010).


Curso intensivo

Os sapatos vermelhos
rasos e sem hesitação,
a mesma presilha do dia
do casamento,
as solas lisas depois de tudo.
Esse calçado e não
um par de sapatilhas forrado a cetim,
provavelmente os pés
arranjados lá dentro,
em pontas,
as fitas que deviam subir pela perna
a desfiarem-se já antes do laço seguro.

Os sapatos vermelhos
permeáveis a todos os passos
escolhidos às cegas.
Vermelhos, hoje mais,
são do jardim e das pedras
da calçada. Servem-me
ainda no primeiro dia de aulas.


Play

Não há na minha lista nenhum nome incompleto,
nenhum pacto sobrevivente,
nenhuma resposta extraviada.

Não há na minha lista manhãs suspensas,
discos em escudos, cobertos ainda pela embalagem.
Não guardo qualquer registo de encomendas adiadas,
pedidos de cliente,
sobras em caixas de plástico,
desejos pendentes de ano novo.

Não há na minha lista tampas
que cheguem para todas as memórias,
nem meia dúzia de colheres com que possa remexer o que ficou.
Não há na minha lista isqueiros normais.
Não me lembro de números de telefone antigos,
qualquer palavra desnecessária,
fotografias com mais de quinze anos.
Na minha vida sempre tive dois filhos.

Nasci com dois seres inteiros –
uma menina e um menino –
dentro de mim,
toda a minha lista acabou de se fazer há dez segundos

És tu, eu, nas polaroids que nunca disparámos da ravina
(este verso que podia ser escrito por ti),
as tampas das caixas de plástico,
talvez os teus livros,
os casacos,
e uma frase com a palavra xadrez
no lugar de um complemento.


Janela

Dias depois, ainda na cama,
não conseguia escolher a melhor saída,
que chão frio podia suportar os meus pés.
O peso das tuas costas, que estavam só
do outro lado, desceu até se somar
ao meu próprio peso sobre os meus pés descalços -
e eu sem saber a que parte da casa podia ligá-los.

Uma janela surpreendente, esquadria perfeita
agora à minha direita
e ar que entrou: talvez pudéssemos
de facto ser respiráveis.

A amanhecer ao longe um azul lento e claro.
Demasiado mais claro
em muito pouco tempo,
atrás da escola, não chegaria a cegar ninguém:
as nuvens mais leves, como os pesadelos,
resgataram antes as possíveis vítimas,
inocentes não declarados que circulam sem saberem
da sua condição ou destino.


Areeiro

O sinal vermelho, o carro
travado. À esquerda, a bomba de gasolina;
à direita, a gaiola equívoca.
Duram um minuto e meio,
a minha espera
e os contos que me visitam,
rápidos monogramas em ponto cruz
dessa louca sem nome.

Morou ali no tempo
em que a cidade acabava antes.
Gritava no corredor
que era um pássaro, nascia de manhã
com asas, as penas caíam-lhe à mesa.
Ao fim do dia, abria-se a porta
da varanda. Arrancou
e comeu todas as petúnias brancas.
Depois, o bordado caído
e os olhos atirados para o céu,
por onde hão-de passar estes aviões
agora. Presos: o tecido no bastidor e o ar no peito
(ao contrário daquele que ainda circula
– a única coisa que as grades não podem segurar).






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