lunes, 21 de febrero de 2011

ADÍLIA LOPES [3.110]


Adília Lopes

Pseudónimo literario de Maria José da Silva Viana Fidalgo de Oliveira, (Lisboa, 20 de abril de 1960) es poeta, cronista y traductora portuguesa.

Hija de una bióloga profesora de botánica en la Facultad de Ciencias de la Universidad de Lisboa y de un profesor de educación secundaria, Adília Lopes estudió física en la Universidad de Lisboa, licenciatura que abandonó, casi terminando, debido a una psicosis esquizo-afectiva, enfermedad de la que siempre habló abiertamente, fuese en su poesía, crónicas, conferencias o entrevistas de medios de comunicación. Dejó de estudiar por consejo médico y comenzó a escribir con la intención de publicar.

Algunas publicaciones:

Um Jogo Bastante Perigoso (edición personal, 1985).
A Pão e Água de Colónia (Frenesi, 1987).
O Marquês de Chamilly (Kabale und Liebe) (Hiena, 1987).
O Decote da Dama de Espadas (INCM, 1988).
Os 5 Livros de Versos Salvaram o Tio (edición personal, 1991).
O Peixe na Água (edición personal, 1993).
A Continuação do Fim do Mundo (edición personal, 1995).
A Bela Acordada (Black Sun Editores, 1997).
Clube da Poetisa Morta (Black Sun Editores, 1997).
O Poeta de Pondichéry seguido de Maria Cristina Martins (Angelus Novus, 1998).
Florbela Espanca espanca (Black Sun Editores, 1999).
Sete rios entre campos (edición personal, 1999).
Irmã Barata, Irmã Batata (Angelus Novus, 2000).
Obra (Mariposa Azual, 2000).
A Bela Acordada (Mariposa Azual, 2001).
Quem Quer Casar Com a Poetisa? (Quasi, 2001).
César a César (Quasi, 2003).
Poemas Novos (Quasi, 2004).
Caras Baratas (Relógio D'Água, 2004).
Le Vrai La Nuit - A Árvore Cortada (Relógio D'Água, 2006).
Caderno (Relógio D'Água, 2007)



A pan y agua de colonia 

Traducción: ANÍBAL CRISTOBO 
y SHEYLA MIRANDA
Nota: SHEYLA MIRANDA


NO MORE TEARS

Quantas vezes me fechei para chorar
na casa de banho da casa da minha avó
lavava os olhos com shampoo
e chorava
chorava por causa do shampoo
depois acabaram os shampoos
que faziam arder os olhos
no more tears disse Johnson & Johnson
as mães são filhas das filhas
e as filhas são mães das mães
uma mãe lava a cabeça da outra
e todas têm cabelos de crianças loiras
para chorar não podemos usar mais shampoo
e eu gostava de chorar a fio
e chorava
sem um desgosto sem uma dor sem um lenço
sem uma lágrima
fechada à chave na casa de banho
da casa da minha avó
onde além de mim só estava eu
também me fechava no guarda-vestidos grande
mas um guarda-vestidos não pode se fechar por dentro
nunca ninguém viu um vestido a chorar


NO MORE TEARS

Cuántas veces me he encerrado a llorar
en el baño de la casa de mi abuela
me lavaba los ojos con champú
y lloraba
lloraba a causa del champú
después se acabaron los champús
que hacían arder los ojos
no more tears dijo Johnson & Johnson
las madres son hijas de las hijas
y las hijas son madres de las madres
una madre lava la cabeza de la otra
y todas tienen el cabello de niñas rubias
para llorar ya no podemos usar el champú
y a mí me gustaba llorar durante horas
y lloraba
sin un disgusto sin un dolor sin un pañuelo
sin una lágrima
encerrada con llave en el baño
de la casa de mi abuela
donde además de mí sólo estaba yo
también me encerraba en el armario grande
pero un armario no se puede cerrar por dentro
nunca nadie ha visto un vestido llorando


NATURA ET ARS

Uma floresta é um labirinto?
um deserto pode ser rocaille?
a vida é um romance?
o mundo é um palco?
um florete é uma flor?
uma serpentina é uma serpente?

Imagino o fim da Terra assim
todas as casas e todas as ruas
desaparecem
assim como todas as pessoas
graças a um cataclismo
sobrevivem apenas os telefones
as baratas e as listas dos telefones
marcianos nos dias a seguir
tentam interpretar a lista dos telefones
os marcianos não estabelecem uma relação
entre os telefones e a lista dos telefones
mas entre a lista dos telefones e as baratas
e essa relação é plenamente satisfatória


NATURA ET ARS

¿Un bosque es un laberinto?
¿un desierto puede ser rocaille?
¿la vida es una novela?
¿el mundo es un palco?
¿un florete es una flor?
¿una serpentina es una serpiente?

Imagino el fin de la Tierra así
todas las casas y todas las calles
desaparecen
así como todas las personas
gracias a un cataclismo
sobreviven sólo los teléfonos
las cucarachas y las guías de teléfonos
marcianos en los días siguientes
intentan interpretar la guía de teléfonos
los marcianos no establecen una relación
entre los teléfonos y la guía de teléfonos
sino entre la guía de teléfonos y las cucarachas
y esa relación es plenamente satisfactoria


AUTOBIOGRAFIA SUMÁRIA DE ADÍLIA LOPES

Os meus gatos
gostam de brincar
com as minhas baratas


AUTOBIOGRAFÍA SUMARIA DE ADÍLIA LOPES

A mis gatos
les gusta jugar
con mis cucarachas


A SALADA COM MOLHO COR-DE-ROSA /  
LA ENSALADA CON SALSA ROSA


1

Conheci a Magda na praia
na praia é uma metáfora obscena
que como as outras metáforas obscenas
pode ser usada quer como eufemismo
quer como insulto
conheço por experiência própria
os dois usos da expressão
na praia


1

Conocí a Magda en la playa
en la playa es una metáfora obscena
que como las otras metáforas obscenas
puede ser usada tanto como eufemismo
cuanto como insulto
conozco por experiencia propia
los dos usos de la expresión
en la playa


2

Eu gosto de me fazer passar
por uma rapariga ordinária
a Magda era mesmo ordinária
a princípio era isto o que mais
me atraía nela depois foi isto
o que sobretudo me desgostou dela


2

Me gusta hacerme pasar
por una muchacha ordinaria
Magda era realmente ordinaria
al principio era esto lo que más
me atraía de ella después fue esto
sobre todo lo que me disgustó de ella


3

As minhas relações com a Magda
de deliciosas passaram a promíscuas
aconteceu-me
o que me tinha acontecido
quando comi salada com molho cor-de-rosa
ao princípio
a salada era deliciosa por causa do molho
depois comecei a perceber
que era mil vezes melhor
estar a comer os vegetais
sem molho do que com molho
o molho impedia-me de comer os vegetais
com gosto
desgostava-me da vida


3

Mis relaciones con Magda
de deliciosas pasaron a promiscuas
me sucedió
lo que me había sucedido
cuando había comido ensalada con salsa rosa
al principio
la ensalada era deliciosa a causa de la salsa
después empecé a darme cuenta
de que era mil veces mejor
comer los vegetales
sin salsa que con salsa
la salsa me impedía comer los vegetales
con gusto
me disgustaba por completo


4

Vivia com a Magda
num quarto de duas camas
quando eu chegava ao quarto
a Magda estava deitada na minha cama
numa posição de Maja desnuda
mas vestida
o que ainda era pior
outras vezes encontrava-a
sentada na minha cadeira
a folhear os meus livros
e a chupar os dedos


4

Vivía con Magda
en un cuarto con dos camas
cuando yo llegaba al cuarto
Magda estaba acostada en mi cama
en posición de Maja desnuda
pero vestida
lo que era aún peor
otras veces la encontraba
sentada en mi silla
hojeando mis libros
y chupándose los dedos


5

A Magda era uma intrusa
depois de ter sido um ser envoûtant
quer como intrusa
quer como envoûtant
ela era para mim
uma fonte de perturbação


5

Magda era una intrusa
después de haber sido un ser envoûtant
sea como intrusa
sea como envoûtant
ella era para mí
una fuente de perturbación


6

Eu não era casta
não porque me entregasse
com a Magda
(que era aliás uma praticante profissional do safismo)
a um prazer que alguns dizem vicioso
(só lhe toquei uma vez
sem querer
e pedi-lhe automaticamente desculpa)
mas porque com a Magda
não tinha prazer nenhum


6

Yo no era casta
no porque me entregase
con Magda
(que era por cierto una practicante profesional del safismo)
a un placer que algunos califican de vicioso
(sólo la toqué una vez
sin querer
y le pedí automáticamente disculpas)
sino porque con Magda
no tenía ningún placer


7

(Acho que o prazer é casto
o que não é casto
é o simulacro do prazer
ou a renúncia ao prazer
tanto o simulacro
como a renúncia)


7

(Pienso que el placer es casto
lo que no es casto
es el simulacro del placer
o la renuncia al placer
tanto el simulacro
como la renuncia)


8

Um dia voltei ao quarto
e a Magda tinha desaparecido
sem deixar marcas
custou-me não encontrar
o chiqueiro próprio da Magda
os meus cigarros fumados
o meu cinzeiro cheio de beatas
sujas de bâton
(que me faziam lembrar / dentes cuspidos após uma briga)
o Las Moradas
antes do Calculus I
na minha estante
quando eu me habituei
a pôr esses livros por ordem inversa


8

Un día volví al cuarto
y Magda había desaparecido
sin dejar rastro
se me hizo difícil no encontrar
el chiquero propio de Magda
mis cigarrillos fumados
mi cenicero lleno de colillas
sucias de pintalabios
(que me recordaban
dientes escupidos después de una pelea)
o Las Moradas
antes de Calculus I
en mi estante
cuando yo me había habituado
a poner esos libros en el orden inverso


9

O que me custou
foi tudo ter acabado
como tinha começado
como se nada se tivesse passado
durante
ora o que se passou
durante
ainda hoje me incomoda
e portanto deve ter acontecido


9

Lo más difícil para mí
fue que todo acabara
como había comenzado
como si nada hubiera pasado
durante
vamos que lo que pasó durante
todavía hoy me incomoda
y por lo tanto debe haber sucedido



A ELISABETH FOI-SE EMBORA
(com algumas coisas de Anne Sexton)

Eu que já fui do pequeno-almoço à lo­ucura
eu que já adoeci a estudar morse
e a beber café com leite
não posso passar sem a Elisabeth
porque é que a despediu senhora doutora?
que mal me fazia a Elisabeth?
eu só gosto que seja a Elisabeth
a lavar-me a cabeça
não suporto que a senhora doutora me toque na cabeça
eu só venho cá senho­ra doutora
para a Elisabeth me lavar a cabeça
só ela sabe as cores os cheiros a viscosidade
de que eu gosto nos shampoos
só ela sabe como eu gosto da água quase fria
a escorrer-me pela cabeça abaixo
eu não posso passar sem a Elisabeth
não me venha dizer que o tempo cura tudo
contava com ela para o resto da vida
a Elisabeth era a princesa das raposas
precisava da mãos dela na minha cabeça
ah não haver facas que lhe cortem o
pescoço senhora doutora eu não volto
ao seu antiséptico túnel
já fui bela uma vez agora sou eu
não quero ser barulhenta e sozinha
outra vez no túnel o que fez à Elisabeth?
a Elisabeth era a princesa das raposas
porque me roubou a Elisabeth?
a Elisa­beth foi-se embora
é só o que tem para me dizer senhora doutora
com uma frase dessas na cabeça
eu não quero voltar à minha vida



ELISABETH SE HA IDO
(con algunas cosas de Anne Sexton)

Yo que ya fui del desayuno a la locura
yo que ya he enfermado estudiando morse
y bebiendo café con leche
no puedo estar sin Elisabeth
¿por qué la despidió señora doctora?
¿qué mal me hacía Elisabeth?
a mí sólo me gusta que sea Elisabeth
quien lava mi cabeza
no soporto que la señora doctora me toque la cabeza
yo sólo vengo aquí señora doctora
para que Elisabeth me lave la cabeza
sólo ella sabe los colores los olores la viscosidad
que me gustan en los champús
sólo ella sabe cómo me gusta el agua casi fría
cayéndome por la cabeza
yo no puedo estar sin Elisabeth
no me venga a decir que el tiempo cura todo
contaba con ella para el resto de la vida
Elisabeth era la princesa de las zorras
necesito sus manos en mi cabeza
ah que no haya cuchillos que le corten el
cuello señora doctora yo no vuelvo
a su antiséptico túnel
ya fui hermosa una vez ahora soy yo
no quiero ser ruidosa y solitaria
otra vez en el túnel ¿qué le ha hecho a Elisabeth?
Elisabeth era la princesa de las zorras
¿por qué me ha robado a Elisabeth?
Elisabeth se ha ido
eso es todo lo que me puede decir señora doctora
con una frase de esas en la cabeza
yo no quiero volver a mi vida



Os namorados
de braço dado
atravessam a rua
e são atropelados
ampu­tados
continuam namorados
mas têm de pintar
tantos cromos de Natal
com as bocas
para ganhar dinheiro
que ficam com as bocas
tão cansadas
que já não se podem beijar
quando se vão deitar
com as bocas
procuram o interruptor
e apagam a luz
mas um carro passa
e eles perdem as bocas
cheias de calos
por tubos de injecções
alimentados
continuam namorados
ó poetas patetas
que confundis hélices
com espirais
deitada a obra
ao lixo
fica o baú
sem nada
à espera da obra



Los enamorados
del brazo
atraviesan la calle
y son atropellados
amputados
continúan enamorados
pero tienen que pintar
tantas estampas de Navidad
con las bocas
para ganar dinero
que sus bocas quedan
tan cansadas
que ya no se pueden besar
cuando se van a acostar
con las bocas
buscan el interruptor
y apagan la luz
pero un coche pasa
y ellos pierden las bocas
llenas de callos
por sondas
alimentados
continúan enamorados
ay poetas payasos
que confundís hélices
con espirales
tirada la obra
a la basura
queda el baúl
sin nada
a la espera de la obra



A DOMADORA DE CROCODILOS

Todos os dias
meto a cabeça
na boca
do crocodilo

O meu feito é feito
de paciência

Já meti
a cabeça
no forno
estava farta
dos crocodilos
e dos amantes

Não tenho tido amantes
tenho tido crocodilos

Com os crocodilos
ganho o pão
e as rosas

Morrer é um truque
como tudo o mais

Dobrada
entre os crocodilos
dobrados
arrisco a pele

A pele é a alma



LA DOMADORA DE COCODRILOS

Todos los días
meto la cabeza
en la boca
del cocodrilo

Mis hechos están hechos
de paciencia

Ya he metido
la cabeza
en el horno
estaba harta
de los cocodrilos
y de los amantes

No he tenido amantes
he tenido cocodrilos

Con los cocodrilos
me gano el pan
y las rosas

Morir es un truco
como todo el resto

Doblada
entre los cocodrilos
doblados
arriesgo la piel

La piel es el alma


Nota:

Prácticamente desconocida en países de habla castellana, Adília Lopes (Lisboa, 1960) es autora de una intrigante y extensa obra poética -22 libros publicados desde 1985, año de su estreno literario con Un Juego Bastante Peligroso. Editado por cuenta propia, su primer volumen de  poemas esboza vigorosamente muchas de las técnicas y temas que se desarrollan en los libros siguientes -por ejemplo, el del desdoblamiento del yo lírico en una multiplicidad de voces. Conjugadas en un mismo texto o vueltas protagonistas de uno o más libros (como en el caso de la monja-personaje Marianna Alcoforado), dichas voces narran historias en las que coexisten la ingenuidad y el grotesco, la melancolía y la parodia, pistas del juego de dobles que es marca registrada de su lirismo. Por detrás de las tantas máscaras que se pueden encontrar en sus poemas, está la que protege su nombre propio, Maria José Viana Fidalgo da Silva -más portugués, imposible.

En su país natal, la autora ha conocido su mayor divulgación a partir del año 2000, gracias a la publicación de la antología Obra, cuya edición reúne los 15 libros publicados hasta entonces. En la misma época fue publicada una antología en Brasil, donde Adília se ha ganado un público que acompaña con atención su producción literaria. Poco a poco, la autora ha traspasado las fronteras del idioma y algunos de sus libros han sido editados en Italia, Francia, Holanda, México y Alemania. A la “poetisa pop” -como se autodenomina en un poema del 2002- le interesa dialogar con la tradición y la modernidad literaria, incorporando citas o personajes de Sophia de Mello Breyner, Sylvia Plath, Anne Sexton, Verlaine, Apollinaire o, retrocediendo en la cronología, nombres como Diderot, Camões o Virgilio.

Para el poeta portugués Nuno Júdice, Adília Lopes “fue la responsable de la demolición del edificio de la poesía moderna del siglo XX en Portugal”, sobre todo por el hecho de que su escritura parezca contraria a cualquier separación o tono sacralizante, por no desear imprimir a su lirismo un aura sublime. Con una sintaxis coloquial, sus poemas se lanzan hacia una metafísica de lo cotidiano, abundante en temas domésticos, para trabajarla con un humor y auto-ironía que rayan por momentos el nonsense. En el centro, sin embargo, siguen presentes temas que le son preciosos, como la crueldad humana o la aleatoriedad de los acontecimientos. Con una mirada atenta, se puede percibir que su poesía es, entre tantas posibilidades, un intento de neutralizar el caos, de poner algo de orden en el mundo -o crear otros mundos posibles, aunque curiosamente, no siempre mejores. 


Arte poética

Escribir un poema
es como coger un pez
con las manos
nunca pesqué así un pez
pero puedo hablar así
sé que no todo lo que viene a las manos
es pez
el pez se debate
intenta escaparse
se escapa
yo persisto
lucho cuerpo a cuerpo
con el pez
o morimos los dos
o nos salvamos los dos
tengo que estar atenta
tengo miedo de no llegar al fin
es una cuestión de vida o muerte
cuando llego al fin
descubro que necesité coger al pez
para librarme del pez
me libro del pez con el alivio
de no saber qué decir



no more tears

cuántas veces me encerré para llorar
en el cuarto de baño de la casa de mi abuela
me lavaba los ojos con champú
y lloraba
lloraba a causa del champú
después se acabaron los champús
que hacían arder los ojos
no more tears dice Johnson & Johnson
las madres son hijas de las hijas
y las hijas son madres de las madres
una madre lava la cabeza de la otra
y todas tienen cabellos de niñas rubias
para llorar no podemos usar más champú
me gustaba llorar sin parar
y lloraba
sin un disgusto sin un dolor sin un pañuelo
sin una lágrima
cerrada con llave en el cuarto de baño
de la casa de mi abuela
donde aparte de mí sólo estaba yo
también me encerraba en el ropero grande
pero un ropero no se puede cerrar por dentro
nunca nadie vio a un vestido llorar



Natura et ars

¿Un bosque es un laberinto?
¿un desierto puede ser rocaille?
¿la vida es una novela?
¿el mundo es un escenario?
¿un florete es una flor?
¿una serpentina es una serpiente?


*

Imagino el fin de la Tierra así
todas las casas y todas las calles
desaparecen
así como todas las personas
gracias a un cataclismo
sobreviven sólo los teléfonos
las cucarachas y las guías de teléfono
los marcianos no establecen una relación
entre los teléfonos y las guías de teléfono
sino entre las guías de teléfono y las cucarachas
y esa relación es plenamente satisfactoria


*

Yo soy el guante
y la mano
Adília y yo
quiero coincidir
conmigo misma


*

Dios es un boomerang
y yo soy su hija pródiga



Body art?

Con las medicinas
engordo 30 kg
el cartero me pregunta
que para cuándo
es el niño
en el transporte público
las personas se levantan
para darme el sitio
me siento siempre
adelgazo 21 kg
las colegas
de la facultad de letras
me preguntan
si es niño
o niña

En el metro
un chico
y un viejo
discuten
si estoy embarazada
el chico quiere
darme su sitio

Detesto

el sufrimiento


La femme de trente ans

Amarás
mi nariz brillante
mis estrías
mis puntos negros
mis textos
mis achaques
y mis manías
y mis gatas
de solterona
o no me amarás



*


No soy
menos
que Einstein
ni que
Claudia Schiffer
No soy
más que una salamanquesa
o que una cucaracha
no soy más inteligente
que un mongoloide
tengo un C.I.
en el límite
superior
de la media
todos diferentes
todos iguales
incluyo también
los animales
lo que nos separa
de los animales
es el pecado original
no es el reconocimiento
en el espejo
ni el complejo
de Edipo


Psycho

Asesinada en la ducha
como Marat
pero sin revolución
ni razón
y la sangre aguada de ella
se va por el desagüe
de la bañera
en el sentido
de las agujas del reloj
en las antípodas
sería al contrario
¿por qué?


*



Los gustos y los disgustos
llevan al poema
como pueden llevar
al precipicio
el poema habla del precipicio
allí habrá llanto
y rechinar de dientes
y no habrá Kleenex
ni el Dr. Abílio Loff
mi querido dentista
el poema habla del precipicio
evitado a tiempo
el poema malo no mata
(más vale burro vivo
que sabio muerto)

*


Este es mi cuerpo
esta es mi sangre
la miseria sexual de las misas
es la miseria sexual de las discotecas
pero este es el mejor de los tiempos
de siempre
todavía muy puritano
y nada púdico
es un tiempo obsceno
pero el de antes era mucho más obsceno
¿qué haré yo con esta espada?
una hoz y un martillo
pulseras anillos y gargantillas
¿qué haré yo con mi yo?
bavarder bavarder bavarder
(¿qué haré yo con este libro?
otro libro aún el mismo
¿qué haré yo con este piano?
improvisos
¿qué haré yo conmigo?
me levanto me siento me acuesto
y me hago
que cada uno tenga su casa
que cada uno tenga su piano)


*


Primero
el dinero

Primero
las facturas

La vida
después

La vida
nunca



Paradoja

Barbie (no es Barbie, es Midge) está embarazada y el bebé recién nacido ya nació, está a la vista en la caja, con Barbie, y Barbie tiene la barriga grande. Imagino que esto confunda a los niños. La muñeca está embarazada, tiene el bebé dentro de la barriga, y el bebé ya está, simultáneamente, fuera. Imagino que Midge y el marido son un matrimonio extremadamente generoso: van a tener un bebé de ellos, hecho por ellos, y adoptaron también a un recién nacido.    En una iglesia católica de Lisboa, en un altar lateral, está Cristo crucificado, colgado en la cruz, y está, en el mismo altar, otra escultura; una Pietà, esto es, María, madre de Cristo, con Cristo, ya muerto, en los brazos y en el regazo. Cristo está muriéndose en la cruz y ya está muerto en el regazo de María. Pero tener en el mismo altar católico un Cristo en una cruz y una Pietà no produce confusión. ¿O sí?
La caja de la muñeca y el altar crean simultaneidad entre dos momentos de narrativa, esto es, de la vida de los personajes, que no pueden ser simultáneos.
El presente, mi presente, es paradójico y ya no se da por eso. Esta no es la era de la sospecha. Es la era de la indiferencia a la paradoja. No sé si esto es bueno o malo. Sé que, para mí, es extraño y excitante. Pero da miedo.
Es como si las paradojas de Mecánica Cuántica caminaran sueltas por el supermercado. Y caminan. Sin alarmar a nadie.


*


Cabra cerda perra burra vaca
bichos queridísimos
¿palabras feas por qué?
tanta estupidez


*

Escribir es ordenar el mundo, desentropiar


*

Entre una cosa y otra pongo otra, obstaculizo, creo obstáculos, como si me gustara saltar obstáculos, como si me gustara fallar. De pequeña, me gustaba caer en el suelo y quedarme con las rodillas sangrando para que mi madre me hiciera pequeñas curas científicas y carantoñas. Caí muchas veces. La razón de caer siempre de rodillas era que siempre corría y llevaba muchas muñecas en las manos que nunca soltaba, de modo que nunca apoyaba las manos al caer, sí las rodillas. En Colares, caí muchas veces así. Pienso que a mi madre también le gustaban las curas. Nunca nadie me dijo, que yo recuerde, que no debía correr con tantas muñecas en las manos. Muñecas y los accesorios de las muñecas. Tenía muchos juguetes. Mi madre me compraba juguetes casi todos los días. Yo no caía a propósito, pero siempre corría con muchos juguetes en las manos y no evitaba caer. Me gustaba caer. Hay en esto, tal vez, masoquismo, perversidad. Pero también hay un sentido de responsabilidad porque las muñecas eran mis hijas y una madre no deja caer a sus hijas al suelo. Digamos, en broma, que mi madre me dejaba caer al suelo. Pienso que esto que acabo de escribir es extraño. La relación con mi madre es sombría, llena de sombras. Madre e hija son como dos árboles que están cerca; viven y mueren de las sombras que se hacen una a otra recíprocamente

Traducción libre de María Mercromina.






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