RICARDO ALFAYA
Ricardo Ingénito Alfaya nació en Rio de Janeiro, Brasil, en 8 de agosto de 1953, y se formó en Ciencias Jurídicas y en Comunicación Social y Periodismo. Escribe poesía, cuento, crónica, reseña, artículo y ensayo. Desde 1980 consta en más de setenta diferentes publicaciones del Brasil y del exterior con diversos trabajos.
Purificación
Distinguido oratorio
genuflexo confesaré a ese auditorio
todos los recados vergonzosos
que puesto que inhibido recatado
indisciplinado lujurioso
comentí en favor de la libídine
Dos puntos abrir piernas
“En pro de la decencia me Confuncio”
– cierra –
Abre los ojos
Fuera, hay un cielo escandalosamente lindo.
Versión de Amelinda Alves y el autor
OS PÁSSAROS
Os pássaros
descem e pousam
suavemente em seus braços
Espantalho ou santo
ele olha para o infinito
Os pássaros não perguntam nada
Ele
crucificado no ar
tem tantas dúvidas
Os pássaros bicam os seus braços
Comem a palha de seus ombros lentamente
Devoram os seus nervos sob a pele
Tingem a sua branca epiderme de dor
E ele sente uma saudade imensa
Ele odeia aqueles pássaros malditos
que trinam horrendamente
alegres canções de amor
LOS PÁJAROS
Los pájaros
bajan y aterrizan
suavemente en sus brazos
Espantapájaro o santo
mira el infinito
Los pájaros no preguntan nada
Él
crucificado en el aire
tiene tantas dudas
Los pájaros pican
sus brazos
Ellos comen la paja de sus hombros despacio
Devoran sus nervios bajo la piel
Tiñen su epidermis blanca de dolor
Y siente una inmensa añoranza
Él odia esos pájaros malditos
que trinan horrendamente
alegres canciones de amor
VINDIMA
Esmago os dias
e as uvas
Minha vida
tinta
seca
Sorvo
gole
a
gole
LA VENDIMIA
Yo amaso los días
y las uvas
Vida mía
tinta
seca
la sorbo
trago
a
trago
OFICINA DE SOMBRAS
A donzela encastelada
As miragens
As projeções sob a luz de velas
Se ao menos ela lançasse ao vento
suas tranças de letras
Mas a torre
dessa inalcançável Rapunzel
é vedada à visitação pública
E de domingo a domingo
o poeta
(impossível dragão)
permanece sozinho
cuspindo palavras de fogo
em sua oficina de sombras
LA OFICINA DE SOMBRAS
La doncella encastillada
Los espejismos
Las proyecciones bajo la luz de velas
Si por lo menos ella lanzase al viento
sus trenzas de letras
Pero en la torre
de esa inalcanzable Rapunzel
se prohíbe la visita pública
Y de domingo a domingo
el poeta
(imposible dragón)
se queda solitario
escupiendo palabras de fuego
en su oficina de sombras
A ANGÚSTIA
DO HIPOPÓTAMO
O hipopótamo
voava para todo o lado
Sempre sob a ameaça
do próprio peso
O hipopótamo sabia
que hipopótamo não voa
E por isso ele deverá
cair
a qualquer momento
O que mais o angustia
todos os dias
é não saber
quantos morrerão
(além dele próprio)
em consequência
da estupenda queda
LA ANGUSTIA DEL HIPOPÓTAMO
El hipopótamo
volaba para todos lados
Siempre bajo la amenaza
del propio peso
El hipopótamo sabía:
el hipopótamo no vuela
Así deberá
caer
en cualquier momento
Pero su más grande angustia
de todos los días
es no saber
cuántos se morirán
(además de él)
por la consecuencia
de la estupenda caída
http://letrasdeveracruz.blogspot.com.es/
O SILÊNCIO DO ROUXINOL
Shuang Sei
queria ver o rouxinol cantar
Mas o pássaro não canta
porque se encontra cercado
por barras de ouro
Shuang Shei não se conforma
gastara uma fortuna
na esplêndida gaiola
GATUNO DA MADRUGADA
Caríssimo Sr. Cachorro
levante as patas
abra a bocarra
passe para cá o osso
Não leve a mal
tampouco discuta comigo
Afinal são os ossos do ofício
Não é você meu melhor amigo?
Meu caro lhe digo
a vida do brasileiro é dura
pura carne de pescoço
Desempregado insone
virei felino noturno
transformei-me
da madrugada
em gatuno
Então não discuta
nem pense em ladrar
que senão me irrito
e hoje estou
matando cachorro a grito
É FANTÁSTICO
Um homem perdido
naquele quarto que é sala
naquela sala que é quarto
TV e janela
olham para ele
Lá fora impassível
aguarda
o infinito
Se impossível o grito
tampouco despejará no ar
o mais ínfimo gemido
Madrugada cai ao chão
mistura-se ao colchonete
que lhe serve de cama
Sem drama
o homem acaba
dormindo
Fim de jogo
Final de domingo
BEM-VINDA
Aqui estás
depois de longa jornada
como quem não quer nada
entrando de mansinho
pela fresta da janela
Motivo de festa
vida
chegaste assim
chegaste a mim
o poeta
Como criança vieste
escondendo brinquedo
fazendo segredo
num dia de sábado
A ti
dirigi minha fronte
ergui o meu brinde
bebi na tua fonte
Beijei com audácia
CRUZADA
Fazer poemas
Como quem joga
Palavras cruzadas
Ver no tabuleiro
Qual melhor pedra
Se enquadra
Contar letras
Ou sílabas
Ou minutos
Da vida que vaga
E passa batida
Fazer poemas como quem joga
Fazer poemas como quem
Nada
POETA EM GESSO
Num tresloucado gesto
escreveu um poema expresso
e quebrou o braço
A dor que deveras sentiu
entortou-lhe a rima
deixando-o em pedaços
No hospital lhe engessaram os versos
Em casa com a ponta dos dedos
rabiscou
poemas dispersos
No peito a ânsia
de que o tempo levasse para longe
o gesso de sua alma
JARDIM-DE-INVERNO
A pele
não cobre
inteiramente meu corpo
Recorro a outros tecidos
ponho a gravata
decido o terno
No fundo de tanto pano
se não me engano
há um homem
que chamam de moderno
Uma vez por ano
a vida aqui fora
combina com esse estranho
habitante interno
Acontece no inverno
DO "ELOGIO DO ÓCIO" DE BERTRAND RUSSELL
Sem ócio
não há filosofia
Que o digam os antigos gregos
que o maldigam os então escravos
Sem ócio
não há poesia
Garante-me um assalariado
Numa noite de sábado
DA JANELA DE UM SÉTIMO ANDAR
Sonolenta a manhã se cobre de nuvens
há em tudo a imensidade do abandono
O meu rosto claro e rarefeito pela brisa
quer saber mais, quer saber se há cais
Percebo que gradualmente me dissolvo
Nada me salva da lenta e certa diluição
o cão que late ali sem rumo e sem dono
o homem ligeiro entrando na contramão
Sempre se perdem as folhas de inverno
Tremores de ventos sopram: "tudo passa"
Mulheres sem graça em compras na feira
feirantes tenores gritando ofertas na praça
Karina, mulher que em verdade não existe
caminha agora pela sala silenciosa e triste
Desliza na manhã os dedos finos e longos
Lá da rua insolente sobe crua uma risada.
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